segunda-feira, 9 de maio de 2011

Aruanda-Robson Pinheiro

Ele era um jovem como qualquer outro de sua época. Naqueles dias de início de século,
acompanhava com satisfação e interesse as notícias a respeito de outros rapazes que
ingressariam na Escola Naval. Era seu sonho trabalhar na Marinha, principalmente após
concluir o curso propedêutico e já contar 17 anos de idade.
Contudo, alguma coisa parecia querer modificar seus planos. Algo estranho ocorria em seu
interior; vozes pareciam repercutir em sua mente, e ele temia estar ficando louco. Como
compartilhar esse fato com seus pais?
Mesmo assim resolveu que iria ingressar na escola da Marinha. Não poderia voltar atrás com
seu sonho.
Começou então a caminhada em direção a seu ideal, que se esboçava naqueles dias que
marcaram o ano de 1908, início do século XX.
Zélio de Moraes era um jovem sonhador.
Mas algo marcava profundamente o psiquismo do rapaz - ”uma espécie de ataque”, como
classificava a família.
- Vez ou outra Zélio parece ficar desmiolado - dizia a mãe.
Ele falava coisas incompreensíveis e parecia ficar todo torto, encurvado mesmo.
- Será que o menino está sofrendo da espinha? - alguém da família perguntou, certa ocasião.
Não havia mais como disfarçar a situação, pois os ataques se repetiam com maior freqüência.
O jeito era levar o rapaz para uma consulta com o Epaminondas. Era um tio de Zélio, que
trabalhava como coordenador do hospício de Vargem Grande.
Em uma conversa do Dr. Epaminondas com o pai de Zélio, o médico relatou:
- Nunca vi coisa desse jeito. O menino se modifica todo, e, para mim, ele não se enquadra em
nada que a ciência consiga explicar.
- Mas se continuar assim ele vai acabar interrompendo seu curso na Escola Naval! O que fazer
com esse menino? Será coisa do demônio? - indagava o pai, aflito.
- Sei lá. De demônio eu não entendo nada. Imagine que, durante os dias em que examinei
Zélio, ele começou a falar com um sotaque diferente, parecendo um velho que mal sabia falar
português. Ele chegou até a dar umas receitas esquisitas de ervas e banhos, chás e outras
coisas. Dizia, num linguajar estranho, que a recomendação era para um outro paciente que
sofria de ”mal da cabeça”...
- Deus me livre, Epaminondas! Esse menino está é com a cabeça afetada mesmo - respondia
a mãe.
Zélio de Moraes retornou novamente à família após os exames do Dr. Epaminondas. Nada
resolveu.
Nova tentativa deveria realizar-se. Zélio foi encaminhado a um padre da família. Exorcismos e
benzeduras foram feitos, mas nada de o demônio sair; em breve chegariam à conclusão de
que nada daquilo surtiria efeito. Mesmo o padre desistiu logo, pois percebeu que suas rezas
não valiam para aquele caso. Durante uma das sessões com o padre, Zélio estremeceu todo,
encurvou-se e deu uma risada gostosa:
- Ih, seu padre, nóis já se conhece de outros tempo, né, zinfio?
- Conhece de onde? Eu não tenho parte com o diabo, não.
- Hi! Hi! Não é o diabo não, seu padre, é ieu memo. Um véio bem maroto.
O padre benzeu a si próprio e deixou Zélio dentro da igreja, abandonando-a sem nada
compreender. O rapaz novamente retorna ao lar, após o insucesso das tentativas
paroquianas. Ainda bem que o padre era membro da família, senão o infeliz teria um outro
fim. Outras técnicas e exorcismos foram aplicados, mas o tal demônio de fala mansa não
arredava pé: Zélio não melhorava de jeito nenhum.
A família, desesperada, já procurava qualquer tipo de ajuda. Sem importar de onde vinha, se
fosse para ajudar a resolver o caso de Zélio, qualquer auxílio seria bem-vindo. Não mais
adiantavam benzeção, consulta com médico ou conselho de padre. Precisavam encontrar uma
explicação e, principalmente, a cura para o estranho mal que acometera o rapaz...............





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