terça-feira, 10 de maio de 2016

Preto-velho na Cultura Brasileira e na Umbanda



Pai Antonio foi o primeiro preto-velho a se manifestar na Religião de Umbanda em seu médium
Zélio Fernandino de Morais onde se estabeleceu a Tenda Nossa Senhora da Piedade. Assim, ele abriu
esta “linha” para nossa religião, introduzindo o uso do cachimbo, guias e o culto aos Orixás.
O “Preto-velho” está ligado à cultura religiosa Afro Brasileira em geral e à Umbanda de forma
específica, pois dentro da Religião Umbandista este termo identifica um dos elementos formadores de
sua liturgia, representa uma “linha de trabalho”, uma “falange de espíritos”, todo um grupo de
mentores espirituais que se apresentam como negros anciões, ex-escravos, conhecedores dos Orixás
Africanos.
São trabalhadores da espiritualidade, com características próprias e coletivas, que valorizam o
grupo em detrimento do ego pessoal, ou seja, são simplesmente pretos e pretas velhas com Pai João e
Vó Maria, por exemplo.
Milhares de Pais João e de Avós Maria, o que mostra um trabalho despersonalizado do elemento
individual valorizando o elemento coletivo identificado pelo termo genérico “preto-velho”. Muitos até
dizem “nem tão preto e nem tão velho” ainda assim “preto velho fulano de tal”. A falta de informação
é a mãe do preconceito, e, no caso do “preto-velho”, muitos que são leigos da cultura religiosa
Umbandista ou de origem africana desconhecem o valor do “preto-velho” dentro das mesmas.
Preto é Cor e Negro é Raça, logo o termo “preto-velho” torna-se característico e com sentido
apenas dentro de um contexto, já que fora de tal contexto o termo de uso amplo e irrestrito seria
“Negro Velho”, “Negro Ancião” ou ainda “Negro de idade avançada” para identificar o homem da raça
negra que se encontra já na “terceira idade” (a melhor idade). Por conta disso alguns se sentem desconfortáveis
em utilizar um termo que à primeira vista pode parecer desrespeitoso ao citar um amável
senhor negro, já com suas madeixas brancas, cachimbo e sorriso fácil, por trás do olhar de homem
sofrido, que na humildade da subjugação forçada e escrava encontrou a liberdade do espírito sobre a
alma, através da sabedoria vinda da Mãe África, na figura de nossos Orixás, vindo de encontro à
imagem e resignação de nosso senhor Jesus Cristo.
Alguns preferem chamá-los apenas de “Pais Velhos” o que é bonito ao ressaltar a paternidade,
mas ao mesmo tempo oculta a raça que no caso é motivo de orgulho. São eles que souberam passar
por uma vida de escravidão com honra e nobreza de caráter, mais um motivo de orgulho em se
autoafirmar “nêgo véio” e ex-escravo; talvez assim se mantenham para que nunca nos esqueçamos
que em qualquer situação temos ainda oportunidade de evoluir. Quanto mais adversa maior a oportunidade
de dar o testemunho de nossa fé.
O “preto-velho” é um ícone da Umbanda, resumindo em si boa parte da filosofia umbandista.
Assim, os espíritos desencarnados de ex-escravos se identificam e muitos outros que não foram escravos,
nesta condição, assim se apresentam também em homenagem a eles, por tê-los como Mestres no
astral.
No imaginário popular, por falta de informação ou por má fé de alguns formadores de opinião, a
imagem do “preto-velho” pode estar associada por alguns a uma visão preconceituosa, há ainda os que
se assustam “com estas coisas”, pois não sabem que a Umbanda é uma religião, e como tal tem a
única proposta de nos religar a Deus, manifestando o espírito para a caridade e desenvolvendo o sentimento
de amor ao próximo. Não existe uma Umbanda “boa” e uma Umbanda “ruim”, existe sim única
e exclusivamente uma única Umbanda que faz o bem, caso contrário não é Umbanda e assim é com os
“Preto-velhos”, todos fazem o bem sem olhar a quem, caso contrário não é de fato um “preto-velho”,
pode ser alguém disfarçado de “velho-negro”, o “preto velho” trabalha única e exclusivamente para a
caridade espiritual.
São espíritos que se apresentam desta forma e que sabem que em essência não temos raça nem
cor, a cada encarnação temos uma experiência diferente. Os pretos velhos trazem consigo o “mistério
ancião”, pois não basta ter a forma de um velho, antes, precisam ser espíritos amadurecidos e
reconhecidos como irmãos mais velhos na senda evolutiva.
Quanto menos valor se dá a forma, mais valor se dá à mensagem, e “preto-velho” fala devagar,
bem baixinho; quando assim se pronuncia, todos se aquietam para ouvi-lo, parece-nos ouvir na língua
Yorubá a palavra “Atotô”, saudação a Obaluaê que quer dizer exatamente isso: “silêncio”.
Nas culturas antigas o “velho” era sempre respeitado e ouvido como fonte viva do conhecimento
ancestral. Hoje ainda vemos este costume nas culturas indígenas e ciganas. Algumas tradições
religiosas mantêm esta postura frente o sacerdote mais velho, trata-se de uma herança cultural
religiosa tão antiga quanto nossa memória ou nossa história pode ir buscar, tão antigos também são
alguns dos pretos-velhos que se manifestam na Umbanda.
Muitos já estão fora do ciclo reencarnacionista, estão libertos do karma, já desvendaram o
manto da ilusão da carne que nos cobre com paixões e apegos que inexoravelmente ficarão para trás
no caminho evolutivo.
Por tudo isso e muito mais, no dia 13 de Maio, dia da libertação dos escravos eu os saúdo: “Salve
os Pretos Velhos! Salve as Pretas Velhas! Adorei as Almas! Salve nosso Amado Pai Obaluaê, Atotô meu
Pai! Salve nossa Amada Mãe Nanã Boroquê, Saluba Nanã!”.
Usamos para eles velas brancas ou bicolores, metade preta e metade branca, tomam café e
fumam cachimbo.

por Alexandre Cumino

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